21 de fevereiro de 2025

Despi as paredes do meu quarto hoje. Agora são apenas brancas e em breve vão deixar de ser minhas.

É tão estranho assim,
Pensar,
Que me enraizei aqui,
neste lugar
Entre quatro paredes brancas

Onde te vi sorrir e chorar.

Assim me despeço com medo,
a tremer entre dedos fantasmagóricos, fracos.
Eram os teus,
que já não irei experienciar.

Os quatro cantos cheiram a tabaco
mas não demasiado.
Cheiram a ti sem lá estares.
e eu tremo com medo de te ver em todos os cantos desta cidade.
Que merda!

Deixo aqui um bocado de mim.
Parto assim,
quieta, sem falar
Com o silêncio como som de fundo
interrompido pelo trânsito intermitente das 11 da noite
e a pouca luz que há do luar.

Ontem vi-te no cineclube e
arrepiou-se-me todo o corpo
mas nem foi de amores
porque, na realidade,
se calhar até seria mais feliz se estivesses morto...

É isso mesmo.

Adorava ir ao teu funeral
vestida de branco, exatamente como uma noiva no dia do próprio casamento.

Anseio ver o teu corpo inerte, gélido e seco.

Gélido não, porque já ele era.
E tu também,
Cabra de merda
que voltaste atrás, subiste a baixa de Coimbra a 8 de Março (do ano passado porque este ano há outra história tão má quanto esta mas isso fica para outro poema, btw viva o dia da mulher, adiante) à procura de outra alma perdida
enquanto sonhava eu, em casa, ter-te nos meus braços.

Macabra, acaba, macaca, cabra...
Só faço anagramas de merda e não te consigo esquecer.
Tudo o que quero é apagar um cigarro mal amanhado na tua testa e ver a ponta a arder.
Desejava olhar para essa cena de um ponto de vista microscópico tipo aqueles vídeos do tiktok que vês quando já não tens mais que fazer.
Tudo o que eu queria mesmo, mas mesmo com toda a força do meu ser, era ver a tua tez a apodrecer.

Morta ou viva?
Sei lá... diz-me tu.
Morta tu, em vida eu.
Mas que merda!
Escrever sobre ti só me traz ódio e repugna

Penso se alguma vez guardaste algum do meu cabelo que cortaste
e fizeste uma boneca de vudu.
Eu tinha tanto cabelo... dava na boa para umas três.

Despido na tua cama,
o meu corpo nu.
"Vai lá ter com as tuas outras namoradas!"
Significa isso que somos namoradas?
Não sei... diz-me tu.
Antes fôssemos
primas e casadas.

Nós não fomos a nenhuma igreja,
não nos casámos,
mas bebemos cerveja.
Somos namoradas?
"Não sei, somos?"
Diz-me tu.
Bebemos do mesmo copo
e aqui está o meu corpo nu,
sobre a tua cama, lençóis e sobre os teus braços...

Sabes uma coisa...
Se fôssemos as duas à igreja provavelmente seríamos excumungadas de lá para fora.
Não haveria casamento nem cerveja para ninguém
e eu acabava sozinha,
exatamente como estou agora.
diários
arrasto o meu corpo invertebrado pelo terreno árido

o esforço que faço para levantar um dedo pesa-me no corpo e esgota toda a minha energia
abrir os olhos custa tanto quanto arrancar um braço com os dentes
desventro-me todos os dias por vontade própria para manter viva a carcaça oca que todas as pessoas vêem

ninguém toca no meu corpo podre e não me admiro
pois nem eu, fosse um dia ser normal, quereria tocar em tal angustiado e venenoso ser
devoro os meus próprios sonhos para não ter esperanças de vir um dia a merecer amor
ser amado é algo a que apenas os abençoados se podem dar ao luxo
eu nem respiro.
o ar que os meus pulmões inspiram é intoxicado por todas as minhas más decisões e pensamentos noturnos
as minhas mãos tremem e escrevo freneticamente sem pensar, na esperança de um dia eventualmente apaziguar alguma parte do que sinto e poder inspirar o ar comum só uma vez
não sei que rumo tomo todos os dias e os meus pés tremem sobre a terra seca e inerte
como pó para bem dos meus males
relembro-me todos os dias, amarro o meu rosto com cordas de juta e coroo-me rainha com uma coroa de espinhos feita do sangue metalizado que cuspo todos os dias na mesma cova
todos os dias escavo o meu próprio futuro no chão com uma colher, o buraco cresce em tamanho, cada vez mais profundo, escuro e vazio
vejo em sonhos que um dia, já em forma de folha murcha, me deitarei lá dentro
e os lençóis que me aconchegam serão as paredes do útero frio de onde fugi